O miado do gato

Para espanto de muitos, o miado, em si não faz parte da comunicação natural entre os gatos. Por outras palavras, os gatos não miam para comunicar entre si, utilizando, para isso, outros sons. Na verdade, os gatos miam apenas para comunicar com as pessoas, sendo esta linguagem uma “invenção” da sua domesticação que, salvo raras exceções, apenas a utilizam para comunicar connosco.

O miado não é a única maneira de nos “falarem”, sendo que também podem ronronar, bufar, rosnar e até mesmo transmitir chamamentos sexuais, mas tudo isto está incluído no seu vocabulário interespecífico que, em diversas circunstâncias, utilizam com as pessoas. Mas para saber o que é exatamente o miado, e por que razão ele nos é tão generosamente dedicado, convém previamente esclarecerem-se alguns conceitos.

SOS infantil

Com base nas palavras, o ser humano pode insultar, elogiar, ameaçar, seduzir… Mas nos animais, que carecem de vocabulário, o tom ou a frequência do som são um alerta das intenções de quem o emite. Um tom grave, como um ronco (ou rosnado de um cão, por exemplo) é ameaçador, enquanto um tom mais agudo “pede” proteção. O choro dos bebés e os chamamentos dos cachorros incluem-se no mesmo padrão: o de falta de proteção, a pedir ajuda.

Curiosamente, tal como a “musicologia”, é de salientar que o miado tem uma frequência alta, infantil, como já vimos, de 700-800 hertz (Hz). A que outro som felino, dentro dos 12 ou 13 classificados, se parece mais?

Bem, não são exatamente o bufar ou os grunhidos (de baixa frequência, entre os 100 e os 250 Hz), mas sim o chamamento que os cachorros trocam com suas mães, mais conhecidos como “latir” ou “ganir”, entre os 250 e os 800 Hz.

Estes sons são vozes curtas, de 0,4 a 0,7 segundos (os miados mais curtos têm a duração de 0,6 segundos, embora o normal seja que se prolonguem entre 3 e 6), emitidos pelos gatinhos com menos de 4 semanas, para chamar a mãe em qualquer situação de alerta: quando são deixados sozinhos, quando têm frio ou quando estão com fome.

O chamamento por “frio” é o mais agudo, embora se vá igualando aos outros, uma vez que a partir das 4 semanas de vida o gatinho será capaz de regular a temperatura sozinho. Por outro lado, o chamamento de “estar preso” é o mais grave (relativamente ao seu tom), enquanto o de “solidão” é o mais longo. Obviamente que a mãe distingue perfeitamente cada um dos sons e responde aos seus cachorros com um tom semelhante.

Podemos agora observar alguma correlação entre os sons infantis e o miado, embora eles tenham as suas diferenças. O ronronar é sempre igual em todas as fases da vida do gato, tanto em adulto como em cachorro, não é alterado. Mas o miado, como tal, não existe nos cachorros. Assim como o chamamento infantil desaparece quando, com cerca de um mês de idade, deixam de depender da mãe, o miado surge pouco depois, a partir dos 3 meses. Podemos assim dizer que se trata da evolução e utilização de um som infantil.

Infantilizados, mas muito inteligentes

Assim sendo, os gatos adultos continuam a ser cachorros? Bem, de certa forma, sim. Trata-se de um fenómeno de “neotenia” ou, por outras palavras, a persistência de características físicas e comportamento infantis, ligados à domesticação, que permitem dominar os animais (vacas, cavalos, ovelhas, cães, etc.), que de outra forma seriam indomáveis.

Ao converter os gatos selvagens em animais de estimação pacíficos, conservou-se, entre outros comportamentos infantis, uma versão corrigida e melhorada dos chamamentos de socorro infantis: o miado.

Mas o que querem os gatos quando miam? Miam para nós, e não para outros gatos, porque querem que lhes prestemos atenção e obterem o que pretendem. Eles pretendem captar a nossa atenção e, assim que a tiverem, obter alimentos, brincadeira, carícias, ou que lhes abramos a porta, e são tão inteligentes que aprendem rapidamente miados especiais para cada situação. Naquilo que nos diz respeito, ao conviver com um gato aprendemos rapidamente o que eles pretendem com cada miado.

Além disso, assim que aprenderem, não existe maneira de calá-los: os gatos podem passar duas horas ou mais a miar ao ritmo de dois miados por minuto… Desta forma, quem terá a coragem de lhes negar algo?

É incrível, mas os gatos conseguiram ligar-se ao nosso meio de comunicação favorito (verbal) e, literalmente, treinar-nos para que lhes prestemos atenção. É genial, porque de seguida eles impõe-nos as suas regras!

Gostar e partilhar esta página